Mudanças na Educação: Vira o disco... e não toca o mesmo
ANA PETRONILHO05/03/2017
13:35
Desde alterações e ajustes nos currículos dos alunos à redução de alunos
por turma e novas regras nos concursos de professores, são várias as mudanças
que vão chegar em Setembro no regresso às aulas. A ex-ministra Manuela Ferreira
Leite alertou esta semana para o perigo das mudanças contínuas na Educação e as
reformas de Tiago Brandão Rodrigues prometem gerar polémica. O SOL faz um
resumo do que já está definido para o arranque do próximo ano letivo.
1- Flexibilização curricular
Uma das
grandes novidades no próximo ano letivo será a alteração dos currículos das
disciplinas, a chamada flexibilização curricular. O Governo ainda não deu a
conhecer os detalhes das alterações, dizendo que só serão aplicadas quando
existirem «consensos alargados». No entanto, é já conhecida a intenção de
aplicar estas alterações para os alunos que vão frequentar anos escolares em
início de ciclo (1.º, 5.º, 7.º e 10.º anos). O secretário de Estado da Educação
já fez saber que os currículos das disciplinas serão reduzidos ao «essencial»,
uma vez que as atuais metas de aprendizagem e os programas das disciplinas «são
extensos e não são atingíveis». Será alargada a todas as escolas a gestão de
25% do currículo dos alunos, podendo ser criadas disciplinas extracurriculares
ou reforçado o horário semanal de algumas disciplinas. Outra das medidas já
conhecida é o «equilíbrio» da carga horária de cada disciplina, estando
previsto o reforço das disciplinas de História, Geografia e Educação Física e a
possível redução do Português e da Matemática.
2- Regresso da Área Projeto e da Educação para a Cidadania
O Governo
vai recuperar, no próximo ano letivo, duas disciplinas: a Área de Projeto e a
Educação para a Cidadania, que no passado se chamou Formação Cívica. Estas duas
disciplinas tinham desaparecido do currículo dos alunos em 2012 com as
alterações do ex-ministro Nuno Crato e em Setembro vão voltar. A Formação
Cívica surgiu em 2001 com a ex-secretária de Estado Ana Benavente, durante o
governo de António Guterres. Agora, o programa da Educação para a Cidadania vai
ser preparado com a secretaria de Estado para a Igualdade, explicou ao Expresso
o secretário de Estado da Educação, João Costa, tendo em conta a idade e o ano
de escolaridade dos alunos. Serão abordados temas como a literacia financeira,
os media, a segurança, a defesa do consumidor ou a saúde. Já o programa da
disciplina de Área de Projeto será da responsabilidade de cada escola, dentro
da autonomia para gerir 25% do currículo. Nesta disciplina, que vai contar para
a nota dos alunos, serão trabalhados projetos interdisciplinares, explicou João
Costa.
3- Redução de alunos por turma
A partir
de setembro, o número de alunos por turma vai encolher. No entanto, esta
redução vai ser aplicada de forma gradual, tendo em conta as «especificidades»
de cada escola. Em abril de 2016, o Primeiro-Ministro disse no Parlamento que
esta redução terá de ser «concretizada com prioridades» e pondo o
«caráter pedagógico» acima da «mera medida administrativa». António Costa
entende que são «prioritárias» na redução de alunos por turma as escolas
sinalizadas como Territórios Educativos de Intervenção Prioritária (TEIP), onde
há mais insucesso escolar, e as escolas onde se registem as taxas mais altas de
abandono escolar precoce. Na altura, António Costa disse ainda que, antes de
reduzir as turmas em todas as escolas do país, o Governo deverá recorrer «às
várias ferramentas disponíveis» que passam por «uma gestão do conjunto de
turmas» e recorrer «à hipótese do desdobramento de turmas». Segundo as contas
do presidente do Conselho Nacional de Educação, David Justino, a redução de
turmas para 20 alunos - como querem o PCP, BE e Os Verdes - terá um impacto de
500 a 700 milhões de euros.
4- Descentralização na Educação
Será
também no decurso do próximo ano letivo que ficarão definidos os contornos das
responsabilidades que vão ser transferidas para as autarquias. Desde o ano
letivo de 2015/2016, ainda na anterior legislatura, 15 autarquias assumiram
responsabilidades na área da Educação, através de um projeto-piloto. Estas
câmaras passaram a poder gerir até 25% dos currículos dos alunos de todos os
anos escolares. Desta forma, podem aumentar o número de horas semanais de
algumas disciplinas ou até passar a organização do ano letivo para dois
semestres. Podem ainda criar disciplinas extracurriculares que se adequem ao
contexto regional. Além disso, os municípios vão gerir todo o pessoal não
docente e podem contratar professores para as disciplinas locais, caso as
escolas não tenham professores para lecionar a disciplina. À exceção das
escolas da Parque Escolar, a manutenção dos edifícios também vai ser
responsabilidade das câmaras. O Governo quer agora alargar a descentralização a
todas as autarquias do país, mas não é claro como se vai compatibilizar a autonomia
das escolas com a descentralização. Os sindicatos estão contra e prometem
greves e manifestações.
5- Vinculação Extraordinária de professores
Ao todo
3.200 professores vão entrar, em Setembro, para os quadros do Ministério da
Educação através da vinculação extraordinária. Podem concorrer a esta
vinculação todos os docentes que tenham pelo menos 12 anos de serviço e que
contem com cinco contratos anuais nos últimos seis anos. Tendo em conta as
listas de colocação de professores publicadas pela Direção-Geral da
Administração Escolar (DGAE) - trabalhadas pelo blogue especialista em
estatísticas de educação “De ArLindo” -, das 3.200 vagas disponíveis, 719
lugares destinam-se a professores do 1º. ciclo. Seguem-se outros 501 lugares
para Educação Especial e outros 224 para Matemática do ensino secundário. Só
estas três disciplinas reúnem, assim, 1.444 vagas (46% do total). Em
contrapartida, há quatro disciplinas (Música, Educação Tecnológica, Alemão e
Latim e Grego) que não vão vincular qualquer professor. É nas regiões de Lisboa
e Vale do Tejo, Porto e Alto Minho que mais vagas vão abrir.
6- Regras da «norma travão» alteradas
Em
setembro vão também ser alterados os critérios da «norma travão». Trata-se da
norma que impede que os professores contratados continuem fora dos quadros
indefinidamente. A partir deste ano passam automaticamente aos quadros todos os
docentes com quatro contratos anuais, no mesmo grupo de recrutamento e em
horário completo. Até aqui esta regra, desenhada pelo ex-ministro da Educação
Nuno Crato, era aplicada a todos os docentes com cinco contratos anuais,
completos e sucessivos no mesmo grupo de recrutamento. Desta forma, há mais 377
docentes que em Setembro passam aos quadros da função pública. Destes, 195 são
docentes de Educação Especial. a que se somam 53 professores do 1.º ciclo e
outros 29 de Espanhol. Lisboa e Vale do Tejo é a zona do país com mais docentes
nesta situação.
7- Reforço da formação de adultos
O Governo
vai reforçar a formação de adultos e abrir mais 32 Centros Qualifica. É nestes
centros que as pessoas com mais de 18 anos - que abandonaram a escola sem terem
concluído o ensino secundário - podem ter aulas e receber um diploma de
competências que lhes confere a equivalência ao 12º ano, quando termina a escolaridade
obrigatória. Podem frequentar estas formações, que vêm substituir o programa
Novas Oportunidades, todos os adultos que não se encontram nem a estudar nem a
trabalhar. Com o reforço dos 32 centros, a rede passa a contar com 300 centros
Qualifica.
8- Grupo de recrutamento Língua Gestual Portuguesa
O
Ministério da Educação vai criar, durante o próximo ano letivo, um grupo de
recrutamento para os professores de Língua Gestual Portuguesa. Desta forma,
estes docentes são enquadrados na carreira, deixando de serem considerados como
técnicos especializados. É também clarificado o seu posicionamento nos vários
concursos de colocação. Para definir alguns critérios do grupo de recrutamento,
o Governo criou um grupo de trabalho que vai apresentar um relatório durante o
próximo ano letivo. Desta forma, em 2018-2019 estes docentes já vão concorrer a
um lugar numa escola dentro do seu grupo de recrutamento. Existem 150
professores de Língua Gestual em Portugal, mas apenas 87 estão, neste momento,
a dar aulas aos mais de mil alunos surdos que existem no país, divididos por 23
escolas de referência, onde existe o ensino bilingue. Há ainda outras dez
escolas que acolhem alunos surdos em turmas de estudantes ouvintes, não tendo
muitas vezes o apoio e os técnicos necessários para o acompanhamento das
turmas.
9- Visitas de estudos pagas pelas escolas
O
Ministério da Educação vai retomar o pagamento das visitas de estudo aos alunos
mais carenciados, do 5.º ao 12.º ano de escolaridade. As visitas deixaram de
ser pagas em 2013 durante o resgate financeiro. Esta é outra das medidas já
anunciadas para entrar em vigor a partir do próximo ano letivo, confirmou ao i
o gabinete de Tiago Brandão Rodrigues. De acordo com o Orçamento do Estado para
2017, «é reposta a comparticipação para as visitas de estudo programadas no
âmbito das atividades curriculares», aos estudantes que fazem parte dos
escalões A e B da Ação Social Escolar (ASE), respetivamente em 100% e 50 % do
valor total. O custo de cada aluno numa visita de estudo é, no mínimo, entre 8
e 10 euros, dizem as escolas. Neste valor está incluído o transporte, o seguro
escolar e as entradas nos locais de visita. A alimentação fica a cargo dos
pais. Fora da comparticipação da ASE ficam os alunos do pré-escolar e do 1.º
ciclo (do 1.º ao 4.º ano), cujas visitas são apoiadas pelas autarquias.
10- Manuais escolares gratuitos para alunos do 1.º ao 4.º ano
Pela
primeira vez, todos os alunos do 1.º ciclo (do 1.º ao 4.º ano de escolaridade)
vão receber de forma gratuita os manuais escolares. No entanto, ao contrário do
que aconteceu este ano letivo, apenas os alunos da escola pública ou que
frequentem turmas de colégios financiadas pelo Estado vão receber os manuais
gratuitamente. Fora desta medida ficam os alunos do ensino privado. Segundo as
contas da secretária de Estado Adjunta e da Educação, Alexandra Leitão, a
distribuição gratuita dos manuais a todo o 1.º ciclo (do 1.º ao 4.º ano) terá
um custo de 12 milhões de euros e serão abrangidos cerca de 394 mil alunos. No
final do ano letivo, os alunos terão de devolver os manuais à escola e em «bom
estado», sob pena de os pais terem de os pagar. Fora da ‘oferta’ estão os
livros de fichas, já que o Ministério da Educação entende que «não são recursos
didáticos obrigatórios».
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